sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

A incansável luta do ser

Na última quarta-feira, 29, participei de uma reunião aqui em minha cidade, com pessoas conhecidas, figuras carimbadas, como se usa no jargão popular, na arte de ter esperanças e correr atrás da consecução de seus sonhos. Estes, na maioria, tem de serem abandonados, devido aos muros intransponíveis, que costumam erguerem-se diante das ideias humanas; mas, de vez em quando, dão certos; e, a cada tentativa com solução vitoriosa, esta compensa todos os esforços baldados em lutas outras. A reunião em pauta foi sobre o estabelecimento de uma recém-criada ong, a MÃOS AMIGAS DE NOSSA SENHORA DE NAZARÉ, uma ideia da Irmã Luciana Correa Quaresma; mais uma dela, entre nós. Trata-se de uma instituição com vistas a promover a pessoa humana, através de estímulos variados, especialmente a educação profissional, ressocialização, enfim, inclusão.
A Irmã Luciana Quaresma está com quase 77 de idade. Com vinte a menos, a maioria das pessoas sonha apenas com uma só coisa: aposentar-se; e viver aquilo que acha ser vida de rico, ou seja: nada fazer. Apenas curtir. Pelo currículo dela, bem que poderia se dar ao luxo de aderir a esse tipo de vida, sem prejuízo algum à sua biografia. Começou a trabalhar aos nove de idade em sua cidade natal, Arouca, região do Porto, norte de Portugal, e nunca mais parou. Entrou numa congregação de irmãs franciscanas pra fazer o que todas costumam fazer; mas nunca se contentou em apenas administrar, muito menos em viver uma vida religiosa comum. Seu currículo é fantástico. Seu grande último investimento foi numa comunidade, à época paupérrima, numa espécie de invasão, hoje o populoso bairro de Teotônio Vilela, nos Ilhéus de São Jorge, sul da Bahia, onde fez aquilo que poderia ser sua despedida para a aposentadoria. Quase foi, porque, com um espírito que faz inveja a muitos jovens, cá está ela, mais uma vez, dedicada a criar mais uma instituição, para com ela operar mais trabalhos de formiguinha, na busca de levantar caídos, habituais ou não, por este nosso velho vale de lágrimas. Repito: poderia muito bem se dar por satisfeita; mas o espírito de luta, de trabalho, não cessa. Há hoje na cidade, e em quase todo o país, uma plêiade de instituições e pessoas a prestar assistência, numa rede de seguridade que faz inveja a muitos países ricos. São pessoas, que, de alguma forma, dedicam-se no servir. Mas são diferentes no modo de agir como age Irmã Luciana. É louvável o trabalho de asilos a deficientes, idosos, a assistência em geral, sem esquecer os bem vindos programas assistenciais do Governo. Mas, em geral, todos administram recursos líquidos e certos. Asilos, em geral, trabalham com aposentadorias ou pensões dos seus internos ou mesmo externos, pagas pela Previdência Social. Não se trata de um paraíso; mas, ao menos no quesito finanças, não tem do que reclamar. O trabalho da Irmã Luciana é diferente. É promoção humana na sua forma mais elementar possível. Pegar o caído, o desesperado, o indiferente, porque miserável crônico, o que absolutamente nada tem, e buscar, através de atos simples, como aprender um ofício, um caminho de soerguimento na luta pela vida. Despertar. Induzir a dar o primeiro passo. Óbvio que neste caminho ela abraça todos os recursos, pedagógicos ou financeiros, desde dar alimento a quem tem fome a encaminhar até a aposentadoria ou outro modo de recepção de benefícios por parte do poder público; desde a doação em forma de serviços prestados por um humilde servente de pedreiro, à verba que o parlamentar venha alocar em nome de sua instituição; mas, a única condicionante que realmente tem importado no seu trabalho é a existência da matéria prima: o necessitado de ajuda. Os meios? Corre-se atrás. Daí em diante, vem as demais condicionantes no executar desse árduo trabalho, como a exigência firme do beneficiado não desistir; a firme vigilância para não deixar-lhe desviar do caminho; e, claro, certo nível de exigência por resultados.
A ong está fundada e já em atividade. E sua inspiradora impaciente porque ainda não abriu nenhum curso profissionalizante; ainda não conseguiu se organizar pra ajudar alguém a ter seu cantinho, sua casa, trabalho que atualmente está mais facilitado pelas políticas públicas existentes, mas, que, se não houver quem bem conduza, não acontece. Enfim, depois de quase 50 anos de experiência em promover vidas, e o natural reconhecimento sobre tempo de plantio e maturação de ideias, percebe-se nela, aquele vigor adolescente de quem quer tudo e agora. Aos 77.  Recentemente ganhou um terreno da Prefeitura para construir sua sede; mas não tem um centavo em caixa pra isso. De fato, a reunião da última quarta foi para que a arquiteta, que está a desenvolver o projeto da construção, o apresentasse. Mas, em se tratando da Irmã Luciana, é natural que dela se espere atropelar alguns processos para logo meter a mão na massa. Ir ao foco da necessidade. Nasceu pra isso. Ser assim. E que ninguém a tente segurar; convencê-la de que já fez o suficiente; de que agora isso ou aquilo. É da natureza dela. E onde houver gente necessitando, pedindo ou não, ela irá intervir.
Que Deus a ajude em mais essa jornada!